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Só o que trabalha tem pão
Escrito por Editor
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quarta-feira, janeiro 18, 2012
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Filósofos
Só o que trabalha tem pão, diz um velho provérbio inspirado no mundo exterior e visível e, coisa curiosa, adaptando-se muito mal à esfera que é, por excelência, a sua. Porque, na verdade, o mundo exterior rege-se pela lei da imperfeição, nele se vê, constantemente, o ocioso obter também o seu alimento e o preguiçoso possuí-lo ainda em muito maior abundância do que o diligente trabalhador. Tudo se acha nas mãos do possuidor do mundo visível em que triunfa a lei da indiferença; o espírito da lâmpada mágica obedece ao seu possuidor, Nuredino ou Aladino, e aquele que detém os tesouros do mundo é realmente patrão, qualquer que tenha sido a maneira como deles se apoderou. Não sucede o mesmo no mundo do espírito, onde reina eterna e divina ordem; ali não chove simultaneamente sobre o justo e o injusto; ali não brilha o Sol com indiferença para os bons e para os maus. Em boa verdade pode dizer-se dali: só o trabalhador tem pão, só o angustiado encontra repouso, só aquele que desce aos infernos salva a bem-amada, só quem empunha a faca recebe Isaac. Ali o pão não é para o preguiçoso, que é enganado, como outrora Orfeu, ludibriado pelos deuses, a quem deram um fantasma em vez de Eurídice; e sofreu tal decepção porque foi um efeminado sem coragem, um mero tangedor de lira e não um homem. Ali de nada serve ter por pai Abraão nem dezessete quartos de sangue nobre salva alguém. Quem se nega a trabalhar sente logo cumprir-se a palavra da Escritura acerca das virgens de Israel: só pode gerar vento; mas o que trabalha gera o seu próprio pai.
Kierkegaard, Temor e tremor.